Lost memories

Longe vão os tempos em que este era um espaço onde me “escondia” e desabafava o que me ia na alma...
Há tanto tempo que não escrevo que já nem sei se me lembro como se faz...
Em tempos este «blog» foi fiel ao nome que lhe dei: «um cantinho para contar qualquer coisa», onde deixava as minhas mágoas e tristezas, angústias e incertezas.... até que tudo isso começou a fazer parte de um passado cada vez mais longínquo e então fiz justiça à premonição que tive quando defini o endereço do «blog»: «memorias-perdidas». Este último muito inspirado no título que o James Horner deu a uma das últimas músicas da banda sonora do filme «Titanic» com o mesmo nome «lost memories». A sua melodia suave, quase “líquida”, faz-nos mergulhar num sossego profundo que nos traz recordações de tempos bons e menos bons, mas que são parte de uma história por nós escrita e que perdurará em nós como tesouro sem preço e ficará como herança para os que nos seguirem.
Mas já passou, realmente, muito tempo desde que alguma coisa me motivou a escrever...

Os tempos mudaram e a espontaneidade da adolescência foi dando lugar a uma maturidade muito frágil que precisou de muitos ajustes, muitas tentativas falhadas da procura da “felicidade absoluta”.

O que nos define é aquilo que nós fazemos e não o que gostávamos de fazer. As pessoas conhecem-nos por aquilo que cumprimos e não por aquilo que dizemos que vamos fazer. Esta última é uma imagem muito política e traz sempre resultados desastrosos para quem assim pensa atingir os seus objectivos.

Muitas vezes não somos felizes com aquilo que temos, nem com o que fazemos e essa desilusão é muitas vezes causa de ruína. Não que nos devamos acomodar sem mais nada e deixar de olhar o horizonte, mas tantas vezes somos insensíveis à realidade que nos rodeia e esquecemos que aquilo que nos é “caro” é tantas vezes inatingível para aqueles que anseiam aquilo que banalizamos. Esquecemos que nada tínhamos quando viemos ao mundo e que nada somos a mais do que aqueles que continuam sem nada. Somos apenas uns manequins que vestimos aquilo que as lojas vendem e os anúncios promovem, mas tantas vezes não temos em nós humanidade suficiente para dar as mãos a quem veste o que já não usamos e come o que deitámos fora.
Desde o meu último «post» que os meus olhos observam o mundo de forma diferente. Os sonhos foram-se realizando e os projectos foram tomando corpo ao mesmo tempo que os objectivos de cada dia se vão cumprindo sustentados num esforço constante por aperfeiçoar o que se faz.

Mas e depois? Deixamos que a ambição desmedida nos conduza a uma insatisfação cada vez maior que nos transforme em pessoas que respeitam cada vez menos os valores humanos e sociais e que não olham a meios para atingir os seus propósitos?
Há muito esquecemos aqueles preciosos momentos de escola primária em que dividíamos o nosso pão com o colega que não tinha, pois a sua mãe não tinha para lhe dar.

Esquecemos o tempo em que jogávamos à bola com ricos e pobres, brancos e pretos, magros e gordos e o que realmente contava era se marcávamos golos ou defendíamos bem. E aí era realmente importante o valor de cada um por aquilo que fazia e não por quem era. Era o capitão aquele que “levava a equipa às costas” e resolvia o jogo num lance de magia e não aquele que lá foi colocado por ser filho deste ou sobrinho daquele. Corríamos campo fora a festejar um golo e éramos, por breves segundos, os melhores jogadores do planeta, melhor que na playstation, melhores que o Figo e o Rui Costa, falávamos daquele golo o resto do dia, íamos para casa, contávamos aos nossos pais e adormecíamos a sonhar com isso. Como era simples ser feliz.
Lembro-me de copiarmos uns pelos outros nos testes e muitas vezes não terminarmos um teste para podermos ajudar o amigo que ainda nem tinha começado. Não olhávamos a regras, nem ao medo de ser apanhado, apenas com o objectivo de valermos ao amigo. Se depois isso era bom ou mau para ele, se conseguia vir a ser um bom estudante, a vida encarregar-se-ia de escolher, mas não seria por nossa causa que ele ia cair.
Nós fazemos muitos cursos, muitos estágios, trabalhamos nas melhores empresas, com os mais graduados quadros nacionais e cada vez estamos mais estúpidos. Mais prepotentes e com a mania de que sabemos tudo.

Nós vivemos num país à beira da bancarrota e continuamos a querer umas férias exóticas, o anel mais bonito da ourivesaria, o carro da moda, a pulseira mais vendida do mercado, o telemóvel da última geração, a casa dos nossos sonhos...

Nós não temos toda a culpa do Estado nos ter governado tão mal ao longo dos anos, das finanças desleixadas que temos, da Europa que nos olha de lado, nem do mundo em que vivemos, mas contribuímos todos um pouquinho para que a nossa sociedade tenha chegado a este ponto.
Nós acedemos à birra do nosso filho que quer uma consola mais evoluída, uma mochila mais bonita, uma bicicleta maior e um telemóvel melhor do que o dos colegas. Acedemos à pressão da nossa mulher para ter isto e aquilo e que vamos de férias para aqui e para acolá porque fulano e sicrano têm e fizeram e aconteceram. E damos por nós a querer passar à frente dos nossos colegas para atingir um lugar mais importante no trabalho que nos permita receber um salário mais condizente com o estatuto social que do qual dizemos ser...

Endividamo-nos, sobreendividamo-nos, perdemos a cabeça e quando vamos ao banco consultar a nossa posição consolidada para saber onde é que nos podemos enterrar um pouquinho mais, somos confrontados com uns absurdos 220 e tal mil euros que são a soma da hipoteca da casa, do crédito para o carro, do cartão de crédito, do descoberto autorizado na conta ordenado e dizem-nos com um sorriso na cara que não temos mais por onde “estrebuchar”.

Vamos para casa desiludidos, entramos numa depressão profunda, discutimos constantemente com a mulher, deixamos de ter paciência para os filhos... Vamos parar à rua com problemas de álcool ou droga e acabamos a traficar e vamos para a cadeia... Quando saímos ninguém quer saber de nós, ninguém nos dá emprego porque não temos boas referências, temos constantes problemas para curar a “ressaca” e tornamo-nos em mais um número a somar àqueles que vivem na rua e são ajudados por instituições de solidariedade.

Num daqueles momentos de lucidez trocamos dois dedos de conversa com um(a) jovem daquelas equipas que distribuem alimentos aos sem-abrigo e contamos-lhe a nossa história na esperança de que ele(a) não tenha o mesmo destino e saiba dar mais valor à vida e às maravilhas que ela só por si lhe proporciona. Que não cometa loucuras e seja feliz com o que consegue à custa do seu empenho e da sua dedicação e não daquilo que consegue através de facilitismos.
Um dia, um dos nossos filhos vai contar a nossa história e dizer que não foi graças ao pai que chegou onde chegou e que se estava à espera dos pais para ter o que tem estava na miséria... Vai se esquecer de tudo o que lhe demos quando era criança e do quanto nos esforçámos para que fosse o puto maravilha lá da turma e tivesse todos os motivos para ter uma elevada auto-estima e condições para atingir o sucesso.
Todos nós podemos evitar isto se, de vez em quando, pararmos um pouquinho e olharmos o mundo como se fosse a primeira vez, olharmos o Homem como se fosse a primeira vez, olharmos o amor como se fosse a primeira vez.

Descobrimos que só nos faz falta o que realmente nos faz felizes. E para isso não precisamos de dinheiro, casas, carros, roupas, nem telemóveis.

Não há pessoa que por mais rica que seja que não precise da água das fontes, do sol que se põe no mar, dos frutos da terra e dos animais do campo para sobreviver. E tudo isto nos foi dado sem que sequer tenhamos pedido. Afinal, que procuramos nós? Ouro no deserto? Luz no fundo do mar? Estamos loucos? Não nos basta aquilo que nos permite viver e conviver? Celebrar a vida e os seus valores humanos e fraternos?

Precisamos de admirar o mundo como ele é, com as maravilhas que só por si nos oferece. Valorizar aqueles que se empenham sem receber nada em troca e segui-los, na esperança de virmos a ser como eles. Precisamos de acreditar em algo e defender essa causa com justiça, dedicação e amor. Precisamos de uma bandeira! Uma pessoa sem valores é como um rio sem direcção, como um pássaro que voa sem rumo...
Ouve-se muito por aí que o mundo precisa de líderes a quem seguir. Eu acredito mais que cada um de nós pode ser um exemplo a seguir se tiver como primeiro e principal lema «dar em si mesmo espaço ao próximo».

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